Uma pausa

A janela de Julia

14 ago 2014 • por Caubi • 4 Comentários

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Julia era fanática por novelas. Era daquelas que frequentava a manicure para poder ler o resumo da semana na revista de fofoca. Seus compromissos eram agendados de acordo com os respectivos horários de transmissão. Ligar pra ela durante a novela das nove era inútil: melhor deixar recado. Já largou aniversário da tia antes de comer o bolo e deixou de ver a avó no interior por causa dos capítulos finais daquela que ela considerava ‘a melhor de todos os tempos’.

Mas na verdade, Julia era uma mulher solitária. A novela era a desculpa para preencher seu tempo e encher sua vida de esperança. Aquele desejo interminável de encontrar um mocinho igual ao da tevê na fila do pão ou andando de bicicleta no parque. Sonhava com o amor verdadeiro e eterno do capítulo final e com aquela festa de casamento, tão clichê, tão romântica e tão open bar.

O grande erro de Julia foi ignorar a vida real para buscar o inatingível da ficção. Ela nunca prestou atenção naquele vizinho tão atencioso e educado, que lhe segurava a porta do elevador e era gentil com a velhinha do andar de baixo, sempre cheia de sacolas. Não era dos mais bonitos, mas como era simpático – e solteiro! Sempre carregava bons livros e bons vinhos. Era cheiroso e puxava papo além da previsão do tempo.

Até a velhinha do andar de baixo já tinha notado o interesse do vizinho – ah, seu nome era Pedro Henrique, impossível esquecer um nome desse – menos a Julia. Mas Pedro Henrique era persistente. Parecia que não iria desistir jamais. Passava verão, outono, inverno. Até que chegou a primavera e, junto com ela a nova inquilina do primeiro andar.

Sua aparência não importava porque ela era uma pessoa apaixonante; e Pedro Henrique inevitavelmente, se apaixonou; se encantou. Ele estava disposto a se encantar e encontrou alguém que se deixou ser encantada. Poderia ser a Julia, mas foi a Carla. E viveram felizes para sempre. Um dia de cada vez, como se fosse o último.

Julia nunca mais assistiu a nenhuma novela. Depois de fechar a porta para a felicidade decidiu abrir uma janela. E seu coração.

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4 Comentários
  1. Maria Helena Goulart de Faria   ///   14/08/2014 - 08H23

    Adorei…já estou aguardando novas crônicas…

  2. Maria Cleo Goulart   ///   14/08/2014 - 11H21

    Amei a maneira como prendeu nossa atenção ……muito boa .Aguardando a próxima.

  3. Gabriela Salmazo   ///   20/08/2014 - 01H12

    Amei também…..faça mais adoro crônicas.

  4. caubi   ///   22/08/2014 - 02H10

    Muito obrigada!
    Em breve irão aparecer mais histórias por aí 🙂

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